Crime Proscrito, de Ricardo Neves


SINOPSE:
A vida não tem preço. A não ser que estejamos a falar com o Sr. Costa, o mais reputado assassino profissional a actuar em Portugal. Desde que lhe paguem, é o que interessa.
O Sr. Costa não tem amigos ou inimigos. É um profissional competente, que não engana ninguém. Mas nem todos são honestos como o Sr. Costa. Há quem, apesar do zelo, prefira atacar o Sr. Costa.
Porquê? O Sr. Costa não quer saber disso para nada. Se alguém o quer atacar, é melhor preparar-se para uma surpresa.


EXCERTO:
«Agachado perante o cadáver, o Sr. Costa tocou-lhe na face ainda fresca com a ponta dos dedos e sentiu um arrepio de prazer percorrendo-lhe o corpo como um impulso eléctrico. Aquela era a parte de que gostava mais: o instante logo a seguir ao último suspiro. Fechou os olhos e respirou fundo, enchendo os pulmões com as exalações pútridas libertadas pelo corpo da sua mais recente vítima.
Levantou-se, tirou a sua máquina digital do bolso e tirou uma foto. Satisfeito com o resultado, o Sr. Costa guardou o aparelho no bolso e terminou o ritual com um acto de pouco simbolismo, mas de grande alívio para a sua bexiga.
Deixou o corpo onde estava—não fosse o senão de estar morto, poderia apreciar a vista do Miradouro de S. Pedro de Alcântara—, indiferente à exposição a que estava sujeito e subiu, confiante e sorridente, até aos Jardins do Príncipe Real. Eram 4:20 da manhã. A malta da noite subia dos bares e discotecas do Bairro Alto e juntava-se ali para um lanchinho da madrugada antes de rumarem para outro pouso.


Passou os Jardins e virou à direita, na Rua Cecílio de Sousa. Desceu até ao número 27. A porta era de metal, estava cheia de grafittis, e a parede de fachada tinha um aspecto igualmente cuidado. Tirou a máquina do bolso, retirou o cartão de memória e enfiou-o por baixo da porta. Aguardou.
E enquanto aguardava, o Sr. Costa tirou o tabaco do bolso, acendeu um cigarro e aguardou mais um pouco. Ouviu algo sendo arrastado e olhou para o vão da porta. Um envelope surgira do outro lado. Agachou-se, pegou no envelope e abriu-o para espreitar o maço de notas de dez contos que lá vinha dentro. O cartão de memória também lá estava.
O Sr. Costa sorriu. Até agora, tudo bem.
Repôs o cartão de memória na máquina e guardou-a no bolso. Dobrou o envelope e enfiou-o nas calças, cobrindo-o com a t-shirt. Desceu até à esquina mais próxima e ficou à espera que os ocupantes da casa saíssem.»